Existem coisas que podem ser vistas, até sentidas, apenas pelo relance. Tão rápido é o nosso cérebro, máquina nevrálgica de cálculo e previsão, que antevê a coisa ali antes mesmo de estar lá, de fato, registrada pelo óculo auditor. Lembro de ter ouvido que tudo que vemos, é, na verdade, uma previsão articialmente-inteligente-gerada pelo cérebro: quando tornamos o olhar a alguma coisa, a imagem demora a ser neurotransmitida até ele, que preenche a informação que falta com uma previsão própria. De certa forma, vivemos num teatro do real (lembro agora do "deserto do real" baudrillardeano -- não que tenha familiaridade com o significado desse termo). Há muita teatralidade na vida, isso é verdadeiro. Talvez Be, Biel e companhia saibam disso melhor do que eu. E toda peça de teatro começa como um script. Nasce mais um roteiro. Cena um. Gênero: dramédia.

    Pelo relance, checo cada coisa que posto, pra ver quem viu. E quando quem tem que ver vê, me dói. Agora, nesse momento que escrevo, não tenho como entender por que diabos motivo que me dói -- afinal, foi postado para este público específico, então é conclusão lógica que deveria me sentir feliz, não é? Mas, veja, ainda assim, dói muito. Pontada aguda, facada, mesmo, dolorida do jeito que uma facada deve doer. A teatralidade da vida também é confabular coisas que nunca foram vividas. Uma facada, golpeada de relance.

    De relance, um encontro; uma noite; um beijo; um olhar fixo, direto, ininterrupto. De relance, uma vida -- parte-se o coração.